domingo, 24 de agosto de 2008

Vamos fazer ciência?

AVALIAÇÃO QUÍMICA DE CORRETIVOS DE ACIDEZ PARA FINS AGRÍCOLAS: UMA NOVA PROPOSIÇÃO

J.C. ALCARDE; A.A. RODELLA
Depto. de Química-ESALQ/USP, C.P. 9, CEP: 13418-900 - Piracicaba, SP.

Scientia Agricola
ISSN 0103-9016 versão impressa
Sci. agric. v. 53 n. 2-3 Piracicaba Maio/Dez. 1996
doi: 10.1590/S0103-90161996000200003

RESUMO: Foi estudado o efeito da granulometria nas determinações do poder de neutralização, do cálcio e do magnésio de corretivos da acidez de solos. É sugerido um procedimento alternativo simplificado para avaliação química desses corretivos, fundamentado em: (1) uso de amostras moídas e passadas em peneira nº 100-ABNT; (2) emprego de um método de determinação do poder de neutralização através da titulação com indicador, de uma alíquota de um extrato diluído, e (3) determinação do cálcio e do magnésio no mesmo extrato obtido para a determinação do poder de neutralização. Esses procedimentos, além de simplificarem a metodologia analítica, permitiriam uma interpretação agronômica mais adequada.
Descritores: corretivos de acidez, avaliação química, procedimento simplificado, PRNT



CHEMICAL EVALUATION OF AGRICULTURAL LIMING MATERIALS: A NEW PROPOSAL

ABSTRACT: The effects of particle size on the determination of the neutralizing value, calcium and magnesium, were studied for agricultural liming materials. An alternative and simplified procedure is suggested for the chemical evaluation of amendments, based on: (1) the use of ground samples passed through sieve number 100-ABNT, (2) the determination of the neutralizing value by titration with an indicator using a diluted extract, and (3) the determination of calcium and magnesium in the same extract used for the determination of the neutralizing value. These procedures simplify the analytical methodology for evaluation of agricultural liming materials, and allow a more suitable agronomic interpretation.
Key Words: agricultural liming materials, chemical evaluation, simplified procedures, PRNT





INTRODUÇÃO

A avaliação química de corretivos da acidez dos solos para fins agrícolas consta das seguintes determinações: poder de neutralização (PN), cálcio e magnésio.

O poder de neutralização é a capacidade potencial do corretivo em neutralizar ácidos (Alcarde, 1992). Na determinação, é dada completa oportunidade ao corretivo de neutralizar ácido (solução de HCl 0,5 N, a quente), e a capacidade obtida é expressa em teor de neutralizante equivalente ao carbonato de cálcio (% ECaCO3) presente na amostra, independente da natureza química do corretivo.

Analiticamente são indicados dois métodos padrões para a determinação do PN: o da titulação potenciométrica e o da titulação com indicador, este último de difícil visualização da viragem do indicador visto que a titulação é feita na suspensão do resíduo da amostra.

O cálcio e o magnésio são também determinados nos seus teores totais extraídos com solução de HCl (1+1) e a quente, e expressos na forma de óxidos (% CaO e % MgO, respectivamente) (Glória et al., 1967; Brasil, 1983; ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTS, 1984). Objetiva essa determinação caracterizar os corretivos da acidez dos solos, que exige que o neutralizante esteja associado ao cálcio e/ou ao magnésio.

Alcarde & Rodella (1996) verificaram que a granulometria da amostra tem influência significativa no resultado do PN; mostraram também que nem todo o cálcio e magnésio dos calcários devem estar associados às bases químicas mas também a outras bases inexpressivas, assim como os constituintes neutralizantes podem estar aprisionados em cristais de outros componentes como sílica, que só são atingidos por um ataque enérgico da amostra.

Ao lado da avaliação química, cujos métodos de determinação foram estudados por Alcarde & Barbin (1978) e mais recentemente por Duarte et al. (1993), os corretivos de acidez também são avaliados fisicamente, isto é, determina-se sua composição granulométrica empregando-se as peneiras nº 10, 20 e 50, segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT. Para os calcários, a partir dos resultados da composição granulométrica calcula-se a reatividade (RE) do produto pela expressão;

% RE = % F10-20 x 0,2 + % F20-50 x 0,6 + % F-50 x 1

sendo:

%F10-20= percentual de produto que passa pela peneira nº10 e fica retido na peneira nº20; % F20-50 = percentual de produto que passa pela peneira nº20 e fica retido na peneira nº50; e F-50 = percentual de produto que passa pela peneira nº50.

Com o valor do PN e o valor da RE calcula-se o Poder Relativo de Neutralização Total (PRNT) do corretivo pela expressão (Brasil, 1986):



que indica o quanto do PN vai reagir no solo a curto prazo (3 meses) em função da granulometria.

Como a granulometria está influenciando o resultado do PN, o valor do PRNT está acumulando duplamente o efeito da granulometria: no PN e na RE.

O objetivo do presente trabalho foi confirmar o efeito da granulometria na determinação do PN dos corretivos de acidez e propor um novo procedimento de avaliação química desses produtos.



MATERIAL E MÉTODOS

Os materiais constaram de amostras de aproximadamente 250 g de corretivos de acidez, na forma de produtos comerciais, escolhidos em função da natureza geológica (sedimentar e metamórfica) e apresentando granulometria variando de fina a grosseira. Uma das amostras, a de nº8, é de calcário calcinado. As amostras foram homogeneizadas e subdivididas em quarteador em duas frações: uma destinou-se à análise granulométrica e a outra à análise química.

A fração destinada à análise química foi subdividida em duas frações: uma foi conservada tal qual e a outra moída para passar em peneira nº100-ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas).

Para a análise química (PN, Ca e Mg) cada determinação foi conduzida segundo o procedimento oficial da legislação brasileira (Brasil, 1983) e também pelo procedimento denominado simplificado que foi o seguinte:

1. Preparo do extrato para as determinações do PN, cálcio e magnésio: Reagente - Solução de HCl 0,5 N, padronizada.

Procedimento - (a) Pesar 1 g da amostra (se calcário) ou 0,5 g (se calcário calcinado, cal virgem ou cal hidratada) com aproximação de 0,1 mg e transferir para copo de 250 ml; (b) Adicionar exatamente 50 ml de solução 0,5 N HCl padronizada, cobrir com vidro de relógio e ferver suavemente por 5 minutos, e (c) Transferir a suspensão para balão volumétrico de 250 ml já contendo aproximadamente 150 ml de água destilada, esfriar, completar o volume e filtrar (ou ainda centrifugar ou deixar decantar).

2. Determinação do PN: Reagentes - Solução de NaOH 0,1 N, padronizada e solução alcoólica de fenolftaleína a 0,5%.

Procedimento - (a) Transferir uma alíquota de 50 ml do extrato para erlenmeyer de 250 ml, acrescentar 50 ml de água destilada e 3 gotas de solução de fenolftaleína a 0,5%; (b) Titular com solução de NaOH 0,1 N padronizada até o aparecimento de uma leve cor rosada. Anotar o volume gasto; (c) Calcular o PN do material, em % CaCO3 equivalente, pela expressão:

PN(%CACO3) =

onde:
N1 = normalidade da solução de HCl
V2 = volume (ml) da solução de NaOH gasto na titulação
N2 = normalidade da solução de NaOH
G = massa (g) da amostra

3. Determinação do cálcio: Reagentes - Solução de hidróxido de potássio - KOH - e cianeto de potássio - KCN - Dissolver 280g de KOH e 2g de KCN em 1 litro de água destilada; - Solução padrão de EDTA 0,010 M - Dissolver 3,7225 g de sal dissódico di-hidratado do ácido etilenodiaminotetracético, previamente seco a 70-80°C por 2 horas, em água destilada e completar o volume a 1 litro; - Solução de calcon - Transferir 100 mg de calcon para copo de 100 ml já contendo 10 ml de trietanolamina e 10 ml de álcool metílico. Esperar dissolver, transferir para recipiente de plástico e conservar em geladeira (duração 30-45 dias).

Procedimento - a) Transferir uma alíquota de 5 ml do extrato para erlenmeyer de 250 ml; (b) Adicionar 100 ml de água destilada, 5 ml da solução de KOH-KCN e 6 gotas do indicador calcon, agitando após a adição de cada reagente; (c) Titular o cálcio com a solução padrão de EDTA 0,010 M até a viragem do indicador da cor vinho para azul puro estável. Anotar o volume (V1) gasto; (d) Desenvolver uma prova em branco e anotar o volume (V2) gasto; (e) Calcular a porcentagem de CaO no material pela expressão:



onde:
V1 = Volume (ml) da solução de EDTA gasto na titulação da amostra
V2 = Volume (ml) da solução de EDTA gasto na titulação da prova em branco
G = Massa (g) da amostra

4. Determinação do magnésio: Reagentes - Solução tampão pH = 10 - Dissolver 67,5 g de cloreto de amônio - NH4Cl - em água destilada, acrescentar 570 ml de hidróxido de amônio - NH4OH - concentrado, 2 g de cianeto de potássio - KCN - 5,0 ml de trietanolamina, 0,616 g de sulfato de magnésio - MgSO4.7H2O e 0,931 g de EDTA dissódico di-hidratado. Completar o volume a 1 litro e homogeneizar; - Solução de eriocromo negro T - Transferir 0,25 g do indicador para copo de 100 ml já contendo 2g de cloridrato de hidroxilamina e 50 ml de metanol. Esperar dissolver, transferir para recipiente de plástico e conservar em geladeira.

Procedimento - (a) Transferir uma alíquota de 5 ml do extrato para erlenmeyer de 250 ml; (b) Adicionar 100 ml de água destilada, 5 ml da solução tampão pH = 10 e 10 gotas da solução de eriocromo negro T, agitando após a adição de cada reagente; (c) Titular o cálcio mais o magnésio com a solução padrão de EDTA 0,010 M até a viragem do indicador da cor vinho para azul puro estável. Anotar o volume (V3) gasto; (d) Desenvolver uma prova em branco e anotar o volume (V4) gasto; e (e) Calcular a porcentagem de MgO no material pela expressão:



onde,
V1 = Volume (ml) da solução de EDTA gasto na titulação do cálcio da amostra
V2 = Volume (ml) da solução de EDTA gasto na titulação da prova em branco do cálcio
V3 = Volume (ml) da solução de EDTA gasto na titulação do cálcio mais magnésio da amostra
V4 = Volume (ml) da solução de EDTA gasto na titulação da prova em branco do cálcio mais magnésio
G = Massa (g) da amostra.

A análise da variância foi estudada segundo o esquema fatorial considerando-se as causas de variação: amostras (14), métodos de preparo de amostras (2) e metodologia analítica (2). Foram efetuadas três repetições de modo a se obter um total de 168 resultados experimentais para cada determinação analítica.



RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados da análise granulométrica das amostras estudadas estão apresentados no TABELA 1, onde é nítida a variação em termos de granulometria, o que foi proposital na escolha das mesmas por ser um fator estudado. Tem-se amostras com granulometrias desde extremamente fina como a amostra 6, até bastante grosseira como as amostras 11, 12, 13 e 14.








Os resultados da análise química efetuada nas amostras tal qual comercializadas são relatados no TABELA 2, enquanto que os referentes às amostras moídas (peneira no 100-ABNT) estão no TABELA 3.















A análise dos resultados da determinação do poder de neutralização indicou haver significância estatística para o método de preparo da amostra e, também para a interação entre metodologia analítica x método de preparo da amostra (prob. F < 1%). Assim, quando se considerou a análise de amostras moídas, os valores de PN pelos métodos oficial e simplificado coincidem, mas em amostras tal qual comercializadas a média dos resultados pelo método simplificado foi ligeiramente superior, isto é, 0,6 unidades de PN.

No caso da determinação de cálcio não se verificou significância estatística pelo teste F para o efeito do método de preparo da amostra ou da metodologia analítica.

Com relação à determinação de magnésio se detectou significância para a interação metodologia analítica x método de preparo da amostra (prob. F < 1%). A média dos resultados da determinação de magnésio foi superior no método oficial em relação ao método simplificado, tanto em amostras moídas como naquelas tal qual comercializados, respectivamente em 0,9 e 1,1 unidades percentuais de MgO.

A diferença significativa mostrada pelo poder de neutralização entre as amostras tal qual comercializadas e moídas leva a considerar que essa característica não deveria sofrer o efeito da granulometria visto que, por definição é o "potencial neutralizante" do corretivo. Com isso, o valor do PRNT, como é oficialmente obtido no Brasil no momento, está influenciado duplamente pela granulometria. O correto seria determinar o poder de neutralização de amostras moídas e passadas pela peneira nº 100-ABNT; e neste caso o método simplificado não difere do oficial.

Quanto ao cálcio, em todas as condições estudadas os resultados foram estatisticamente semelhantes, mostrando que o cálcio é igualmente solubilizado quer a amostra seja grosseira ou moída, quer o ataque ácido seja enérgico (método oficial) ou brando (método simplificado). Já para o magnésio, em todas as condições estudadas os resultados foram estatisticamente diferentes. Isso leva a supor que o cálcio deve estar associado quase exclusivamente ao carbonato enquanto o magnésio se associa também a outros ânions (fosfato, silicato, etc.), de solubilização mais difícil. Considerando que nas condições normais do solo o calcário será submetido à solubilização relativamente lenta pelo leve ataque do produto pelos ácidos fracos do solo, a solubilização mais branda da amostra, que ocorre na determinação do PN, condiz melhor com o comportamento agronômico, apesar dessa solubilização ser ainda mais enérgica do que a que ocorre no solo.

Aceita essa condição, a análise química de corretivos agrícolas pode ser bastante simplificada: um único extrato (o da determinação do poder de neutralização) serve para as três determinações: do poder de neutralização, do cálcio e do magnésio. E a determinação do poder de neutralização é simplificada para uma titulação com indicador, eliminando o uso do potenciômetro.



CONCLUSÕES

Na avaliação dos corretivos agrícolas pela análise química, as amostras sendo moídas e passadas em peneira nº 100 -ABNT foram mais adequadas à análise (pesa-se uma amostra mais homogênea) e ao cálculo do PRNT.

Empregando-se a amostra moída, o uso do extrato do poder de neutralização para as determinações do poder de neutralização, do cálcio e do magnésio deram resultados mais adequados às interpretações agronômicas, além de simplificar significativamente a análise química dos corretivos.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALCARDE, J.C.; BARBIN, D. Método simplificado de solubilização de calcários agrícolas para a determinação de cálcio e magnésio. Anais da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", 35:509-519, 1978. [ Links ]

ALCARDE, J.C. Corretivos da acidez dos solos. São Paulo: ANDA, 1992. 26p. (Boletim Técnico 6). [ Links ]

ALCARDE, J.C.; RODELLA, A.A. O equivalente em carbonato de cálcio dos corretivos da acidez dos solos. Scientia Agricola, v.53, n.2/3, p.6-12, maio/dez. 1996. [ Links ]

ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTS. Official Methods of Analysis. 14 ed. Arlington: AOAC, 1984. 1141P. [ Links ]

BRASIL. Ministério da Agricultura. Secretaria Nacional de Defesa Agropecuária. Análise de corretivos, fertilizantes e inoculantes: métodos oficiais. Brasilia: LANARV, 1983. 104p. [ Links ]

DUARTE, A.P.; BOGNOLA, I.A.L ALVAREZ, V.H.; DIAS, L.E. Avaliação de métodos de determinação do poder de neutralização e teores de cálcio e magnésio de calcários. Revista Brasileira Ciencia do Solo, v.17, p.305-310, 1993. [ Links ]

GLÓRIA, N.A.; CATANI, R.A.; MATUO, T.A. Determinação do cálcio e magnésio em rochas carbonatadas pelo método do EDTA. Revista de Agricultura, v.42, p.65-74, 1967. [ Links ]

Vamos fazer "ciença"?

Cante Lá Que Eu Canto Cá
Patativa do Assaré
Composição: Patativa do Assaré

Poeta, cantô de rua,
Que na cidade nasceu,
Cante a cidade que é sua,
Que eu canto o sertão que é meu.

Se aí você teve estudo,
Aqui, Deus me ensinou tudo,
Sem de livro precisá
Por favô, não mêxa aqui,
Que eu também não mexo aí,
Cante lá, que eu canto cá.

Você teve inducação,
Aprendeu munta ciença,
Mas das coisa do sertão
Não tem boa esperiença.
Nunca fez uma paioça,
Nunca trabaiou na roça,
Não pode conhecê bem,
Pois nesta penosa vida,
Só quem provou da comida
Sabe o gosto que ela tem.

Pra gente cantá o sertão,
Precisa nele morá,
Tê armoço de fejão
E a janta de mucunzá,
Vivê pobre, sem dinhêro,
Socado dentro do mato,
De apragata currelepe,
Pisando inriba do estrepe,
Brocando a unha-de-gato.

Você é muito ditoso,
Sabe lê, sabe escrevê,
Pois vá cantando o seu gozo,
Que eu canto meu padecê.
Inquanto a felicidade
Você canta na cidade,
Cá no sertão eu infrento
A fome, a dô e a misera.
Pra sê poeta divera,
Precisa tê sofrimento.

Sua rima, inda que seja
Bordada de prata e de ôro,
Para a gente sertaneja
É perdido este tesôro.
Com o seu verso bem feito,
Não canta o sertão dereito,
Porque você não conhece
Nossa vida aperreada.
E a dô só é bem cantada,
Cantada por quem padece.

Só canta o sertão dereito,
Com tudo quanto ele tem,
Quem sempre correu estreito,
Sem proteção de ninguém,
Coberto de precisão
Suportando a privação
Com paciença de Jó,
Puxando o cabo da inxada,
Na quebrada e na chapada,
Moiadinho de suó.

Amigo, não tenha quêxa,
Veja que eu tenho razão
Em lhe dizê que não mêxa
Nas coisa do meu sertão.
Pois, se não sabe o colega
De quá manêra se pega
Num ferro pra trabaiá,
Por favô, não mêxa aqui,
Que eu também não mêxo aí,
Cante lá que eu canto cá.

Repare que a minha vida
É deferente da sua.
A sua rima pulida
Nasceu no salão da rua.
Já eu sou bem deferente,
Meu verso é como a simente
Que nasce inriba do chão;
Não tenho estudo nem arte,
A minha rima faz parte
Das obra da criação.

Mas porém, eu não invejo
O grande tesôro seu,
Os livro do seu colejo,
Onde você aprendeu.
Pra gente aqui sê poeta
E fazê rima compreta,
Não precisa professô;
Basta vê no mês de maio,
Um poema em cada gaio
E um verso em cada fulô.

Seu verso é uma mistura,
É um tá sarapaté,
Que quem tem pôca leitura
Lê, mais não sabe o que é.
Tem tanta coisa incantada,
Tanta deusa, tanta fada,
Tanto mistéro e condão
E ôtros negoço impossive.
Eu canto as coisa visive
Do meu querido sertão.

Canto as fulô e os abróio
Com todas coisa daqui:
Pra toda parte que eu óio
Vejo um verso se bulí.
Se as vêz andando no vale
Atrás de curá meus male
Quero repará pra serra
Assim que eu óio pra cima,
Vejo um divule de rima
Caindo inriba da terra.

Mas tudo é rima rastêra
De fruita de jatobá,
De fôia de gamelêra
E fulô de trapiá,
De canto de passarinho
E da poêra do caminho,
Quando a ventania vem,
Pois você já tá ciente:
Nossa vida é deferente
E nosso verso também.

Repare que deferença
Iziste na vida nossa:
Inquanto eu tô na sentença,
Trabaiando em minha roça,
Você lá no seu descanso,
Fuma o seu cigarro mando,
Bem perfumado e sadio;
Já eu, aqui tive a sorte
De fumá cigarro forte
Feito de paia de mio.

Você, vaidoso e facêro,
Toda vez que qué fumá,
Tira do bôrso um isquêro
Do mais bonito metá.
Eu que não posso com isso,
Puxo por meu artifiço
Arranjado por aqui,
Feito de chifre de gado,
Cheio de argodão queimado,
Boa pedra e bom fuzí.

Sua vida é divirtida
E a minha é grande pená.
Só numa parte de vida
Nóis dois samo bem iguá:
É no dereito sagrado,
Por Jesus abençoado
Pra consolá nosso pranto,
Conheço e não me confundo
Da coisa mió do mundo
Nóis goza do mesmo tanto.

Eu não posso lhe invejá
Nem você invejá eu,
O que Deus lhe deu por lá,
Aqui Deus também me deu.
Pois minha boa muié,
Me estima com munta fé,
Me abraça, beja e qué bem
E ninguém pode negá
Que das coisa naturá
Tem ela o que a sua tem.

Aqui findo esta verdade
Toda cheia de razão:
Fique na sua cidade
Que eu fico no meu sertão.
Já lhe mostrei um ispeio,
Já lhe dei grande conseio
Que você deve tomá.
Por favô, não mexa aqui,
Que eu também não mêxo aí,
Cante lá que eu canto cá.

sábado, 23 de agosto de 2008

Bem-vindos

Este é o blog da disciplina de Metodologia Científica, do curso de Química da UFCG, campus de Cuité.